Caminhabilidade

Caminhabilidade

17 de novembro de 2017
por Amanda Cordeiro Ribeiro -
Colégio Recanto - Rio de Janeiro, RJ


Em muitas cidades do Brasil, os pedestres parecem participar involuntariamente de um jogo de tabuleiro, em que se avança lentamente, ora enfrentando obstáculos, ora voltando algumas casas. Entre os entraves estão calçadas estreitas, vias mal iluminadas, carros passando perto demais, falta de conexão com outros meios de transporte, tempo de travessia longo em avenidas.

E se os governos valorizassem mais os dois pés e menos as quatro rodas, aumentando a chamada caminhabilidade das áreas urbanas? Seria benéfico para as pessoas e para as cidades, dizem médicos, ambientalistas, arquitetos, ativistas e até economistas.

Segundo o livro Drawdown: The Most Comprehensive Plan Ever Proposed to Reverse Global Warming (Drawdown: o mais abrangente plano já proposto para reverter o aquecimento global, em tradução livre), do ambientalista e pesquisador americano Paul Hawken, se houver mais investimento na caminhabilidade nas cidades até 2050, cerca de 5% dos trajetos atualmente feitos com carro passarão a ser realizados a pé. Essa mudança evitaria que 2,9 gigatoneladas de gás carbônico fossem lançadas na natureza.

Mais pedestres, mais saúde

Avançar nas casas desse jogo de tabuleiro significa fazer mais atividade física – uma ajuda para combater a obesidade e os males que podem surgir em decorrência dela, como diabetes, hipertensão e problemas cardiovasculares e nas articulações.

Deixar o carro em casa para ir até o trabalho ou a escola também colabora para reduzir a emissão de gás carbônico. E diminuir a poluição influencia na queda da incidência de doenças respiratórias.

Cidadãos com mais disposição física e menor índice de obesidade são menos propensos a desenvolver doenças e, por consequência, usam menos o sistema público de saúde. Isso gera economia para os governos.

Os passos para a caminhabilidade

Mas o que é realmente necessário para uma cidade se tornar mais caminhável? Estudos como o do pesquisador americano Jeff Speck e o Índice de Caminhabilidade, desenvolvido pelo Instituto de Políticas de Transporte & Desenvolvimento (ITDP), seguem para uma mesma tese: não basta criar trajetos que levem os cidadãos do ponto A ao B. É preciso tornar o caminhar tão bom ou melhor do que ir de carro. Para isso, uma cidade deve levar em consideração seis pontos essenciais.

O primeiro diz respeito à mobilidade, deixando de priorizar os carros e focando nos pedestres. No livro Cidade Caminhável, Jeff Speck argumenta que construir mais avenidas ou abrir faixas em uma rua não melhoram o trânsito, e, sim, aumentam o fluxo de veículos, porque induzem a demanda. Tanto o autor quanto o ITDP sugerem investir em um sistema de transporte coletivo de fácil acesso, que permita às pessoas chegarem a pé até ele. “A integração é fundamental porque caminhar é uma alternativa apenas para pequenas e médias distâncias. Para longas, precisamos de ônibus, metrô, trens”, diz Angélica Benatti Alvim, diretora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Mackenzie, em São Paulo.

O exemplo destacado por especialistas é Nova York, eleita a cidade mais caminhável do país pelo WalkScore, índice que mede a eficiência da caminhabilidade nas cidades. Em NY, sempre se está a 15 muitos a pé do transporte público. Em outra cidade americana, Portland, o número de moradores que pedalam para ir ao trabalho passou de 1% para 8% em 15 anos, com um investimento em políticas públicas que representam apenas 1% do orçamento da área de transporte.

Ruas amigáveis

Outros pontos pró-caminhabilidade dizem respeito à segurança pública e viária, com medidas para tornar as ruas iluminadas, incentivar o maior fluxo em locais isolados e reduzir o tempo de espera do pedestre em travessias.

Nesse pacote entra também a qualidade das calçadas. Uma cidade que quer mais pedestres precisa de passeios públicos com proteção contra carros em ruas movimentadas. O ideal é que as calçadas sejam largas, sem obstáculos e acessíveis também para deficientes, idosos e crianças, com bancos para descanso. “Lisboa é um exemplo de reforma urbana simples que levou esses itens em conta, pensando no pedestre”, afirma Angélica Alvim, do Mackenzie.

Bairro multiuso

Fazer com que o trajeto a pé seja tão ou mais vantajoso do que de carro passa também por dar aos passantes mais conforto. Como caminhar à sombra soma pontos nessa área, plantar árvores é uma iniciativa relevante.

O último ponto diz respeito a bairros e regiões de uso misto, que reúnem casas, parques, escolas, escritório e comércio. A ideia é a seguinte: podendo levar os filhos à escola ou passar no mercado a pé, um morador vai se sentir menos propenso a pegar o carro. Em Nova York, andar até uma média de dez restaurantes, bares e cafés leva apenas 5 minutos, segundo o índice WalkScore.

Com reformas pró pedestres, pode-se reduzir o uso do carro entre 20% a 40%, segundo a organização americana Urban Land Institute. São Paulo tem potencial para crescer nesse aspecto, já que 25% dos deslocamentos utilizando automóvel são feitos em trajetos curtos, num perímetro de 3 quilômetros. No Brasil, 36% da população caminha até o trabalho, segundo a Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP). Outros 31% utilizam carro e 29%, o transporte público. Ainda há espaço para incentivar mais gente a sair a pé e encarar o tabuleiro urbano.

 

Fonte: https://ndonline.com.br/florianopolis/noticias/cidades-adotam-conceito-de-mobilidade-que-favorece-pedestres

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