Europa endurece regras contra imigrantes ilegais

Europa endurece regras contra imigrantes ilegais

19 de junho de 2008
por Ricardo Abrate Luigi Junior -
Colégio Recanto - Rio de Janeiro, RJ


DANIELA ROCHA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM BRUXELAS

A partir de 2010, imigrantes considerados ilegais nos países da União Européia poderão permanecer presos, em centros especiais de detenção, por até um ano e meio, sem julgamento, até que sejam deportados. O Parlamento Europeu aprovou ontem a chamada Diretiva de Retorno, que determina regras comuns para lidar com imigrantes irregulares que não têm permissão legal para entrada, permanência ou residência em países da UE.

Hoje, a detenção varia de país para país e é aplicada de acordo com leis nacionais. A Diretiva de Retorno foi apelidada de Diretiva da Vergonha por ONGs que defendem os imigrantes.

Com a diretiva, todos os imigrantes ilegais no bloco passarão por procedimentos comuns. Uma vez identificados, receberão por escrito a decisão administrativa ou judicial para sua deportação. Terão prazo entre 7 e 30 dias para saírem voluntariamente. Após esse período, as autoridades emitirão ordem de remoção. Se considerarem que há risco de fuga, o imigrante pode ser preso mesmo sem autorização judicial.

A detenção pode acontecer também em outros casos. Por exemplo, se o imigrante tentar evitar a preparação do seu processo de deportação ou simplesmente não apresentar a documentação solicitada. A lei prevê também a deportação de crianças desacompanhadas.
Se o imigrante não sair voluntariamente, a decisão de deportação será acompanhada de uma proibição de ingresso aos países da UE por até cinco anos. Para os opositores da lei, isso significa uma dupla punição.

A votação
Deputados do Partido Verde consideraram a proposta inaceitável por incluir deportação de imigrantes a países de trânsito - o país de onde o imigrante veio antes de chegar à UE, que não é necessariamente o país do qual é cidadão - e por aumentar o período máximo de detenção na maioria dos países. Ainda assim, a diretiva foi aprovada com 369 votos a favor, 197 contra e 106 abstenções.

A reação contrária à adoção da diretiva também partiu de diversas organizações de defesa dos direitos humanos. A Anistia Internacional considera a nova lei inaceitável para os padrões europeus e defende que a prisão de imigrantes ocorra apenas em casos excepcionais.

A Associação Européia de Defesa dos Direitos Humanos considerou inaceitável a possibilidade de detenção de homens, mulheres e crianças por até 18 meses simplesmente por terem permanência irregular. A entidade criticou severamente vários pontos da lei, como a detenção de crianças sob o pretexto de manter a unidade familiar e a deportação para países de trânsito, onde os imigrantes podem, inclusive, ser detidos como ilegais.

Durante o debate parlamentar sobre a diretiva, o relator da proposta, o conservador alemão Manfred Weber, afirmou compreender que as "ONGs que defendem os direitos dos imigrantes podem não estar muito contentes com o texto", mas retrucou que "essas mesmas ONGs passarão a usar a base legal criada pela diretiva para proteger os imigrantes".

Ele considera o texto positivo, pois cria bases legais comuns a todos os países da UE.

Pacote completo
O comissário de Justiça da UE, Jacques Barrot, explicou aos eurodeputados que a Diretiva de Retorno será apenas um dos pilares de uma futura política comum sobre imigração. Além de regras comuns para deportação, a UE pretende adotar normas únicas sobre emissão de vistos permanentes ("blue card") para trabalhadores altamente qualificados e uma grande reforma da legislação comunitária sobre asilo político. Segundo Barrot, a Diretiva do Retorno é parte de "um pacote que ajudará a UE a ter uma imigração planejada".

A diretiva foi proposta pela Comissão Européia (órgão executivo da UE) em 2005 e teve tramitação difícil. Foi modificada diversas vezes pelo Parlamento e pelo Conselho de Ministros dos 27 membros.

Na última reunião do Conselho de Ministros do Interior, em 5 de junho, chegou-se a um compromisso sobre a diretiva, depois de modificado o artigo que obrigava os governos a prestarem assistência jurídica gratuita para os imigrantes ilegais detidos. Alguns países manifestaram-se contra a cláusula, afirmando que não teriam recursos para isso. A solução veio na forma da criação de um fundo de assistência, com valor inicial de 700 milhões, a ser bancado pelo orçamento da Comissão Européia. Segundo Barrot, a criação do fundo garantirá a "ajuda legal e os cuidados com a saúde dos imigrantes detidos".

O presidente francês, Nicolas Sarkozy, elegeu o tema da imigração como prioridade da presidência do Conselho da UE, que será exercida pela França no segundo semestre deste ano. Sarkozy pretende fechar o ano com a aprovação de um ambicioso "pacto europeu sobre imigração".


Brasileiros estão entre principais atingidos por lei

O endurecimento das normas contra imigração ilegal na Europa pode atingir especialmente os brasileiros. Atualmente, os nascidos no país estão em quarto lugar na tentativa de entrar ilegalmente na UE, atrás de iraquianos, chineses e turcos.

Os dados são da Agência de Controle de Fronteiras da União Européia (Frontex), com sede em Varsóvia.
No ano passado, 9.410 brasileiros foram inadmitidos nos aeroportos europeus. O Reino Unido foi o país que mais recusou admissão de brasileiros, seguido de Espanha, Portugal e França.

Com o euro fortalecido, mais brasileiros optaram por viver em algum país europeu. Ao longo de 2007, 17 mil brasileiros foram encontrados em situação irregular na UE. O maior número de casos foi identificado em Portugal, seguido por Espanha e Bélgica.

A procura pela Europa pode estar ligada ao declínio da busca pelos EUA como eldorado. A exigência de visto, a partir de outubro de 2005, a brasileiros que vão para o México - principal porta de entrada para os EUA - contribuiu para uma queda na tentativa de imigração ilegal ao país norte-americano.
Segundo dados da agência americana de fronteiras, em 2006, 1.460 brasileiros foram presos tentando cruzar ilegalmente as fronteiras americanas - contra 31.071 em 2005. (DR)

Fonte: Jornal Folha de São Paulo do dia 19 de junho de 2008.

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