40% de carne e soja vêm da Amazônia Legal

40% de carne e soja vêm da Amazônia Legal

15 de junho de 2008
por Ricardo Abrate Luigi Junior -
Colégio Recanto - Rio de Janeiro, RJ


Governo e empresários rejeitam recuar a produção; ambientalistas classificam o agro negócio como principal causa de devastação local.

MARTA SALOMON

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Com pouco mais de 5 milhões de quilômetros quadrados, dos quais 83% são dominados por floresta, a Amazônia Legal já responde por quase 40% da produção de carne e soja do país. Os dados são do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Comparados aos números gigantes da produção, são "simbólicos" os primeiros resultados da ação do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) contra o agro negócio associado ao desmatamento da Amazônia -região que concentra 36% da pecuária e 39% da cultura de soja nacionais.
Na investida contra o "boi pirata", o instituto acaba de apreender 3.500 cabeças de gado em propriedades embargadas por desmatamento ilegal. Os fiscais já haviam apreendido 4.300 toneladas de grãos em áreas igualmente embargadas.

Floresta
Embora a fatia de cerrado da Amazônia Legal (16% da área) se mostre altamente produtiva ao agro negócio, os dados oficiais mostram que a atividade ocupa amplas áreas do que já foi floresta um dia.

O avanço sobre a floresta se mostra mais contundente no caso da pecuária: 73% das 74 milhões de cabeças de gado da região são criadas no bioma Amazônia, jargão que designa a floresta. Esse avanço é mais expressivo em Mato Grosso, Rondônia e Pará, que lideram o ranking do desmatamento.

O agro negócio é apontado por ambientalistas como principal causa da devastação da Amazônia, algo contestado por ruralistas e setores do governo. Acompanhando o aumento dos preços de commodities como soja e carne, as motos serras se aceleraram desde 2007, depois de três anos de queda no ritmo do abate de árvores.
Neste ano, o desmatamento deve superar 12 mil quilômetros quadrados, o equivalente a oito vezes a cidade de São Paulo. O ritmo acelerado das motos serras, captado por imagens de satélites do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), ainda não aparece nos dados colhidos pelo IBGE.

Sem recuo

O recuo do agro negócio na Amazônia Legal é uma hipótese descartada pelo governo e por representantes dos produtores ouvidos pela Folha. "A tendência é um aumento da produção em áreas de floresta já abertas", resume Rodrigo Justos de Britto, assessor técnico da CNA (Confederação Nacional de Agricultura), em coro com o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes.

"Não é preciso derrubar uma árvore para aumentar a produção", argumenta Carlos Rodenburg, em uma espécie de mantra repetido em público pelos produtores. Rodenburg preside a Agropecuária Santa Bárbara e está à frente do maior rebanho bovino da Amazônia, em sociedade com o banqueiro Daniel Dantas.
Pouco mais de dois anos depois de se instalar na região, a Santa Bárbara já cria meio milhão de cabeças de gado no sul do Pará e no norte de Mato Grosso, na região que concentra ações de combate ao desmatamento.


As pastagens já ocupam 700 mil quilômetros quadrados, ou 13,5% da Amazônia Legal. Nessa área, foram produzidas 2,7 milhões de toneladas de carne em 2006, o equivalente a 36% da produção nacional.

Dados organizados pela ONG Amigos da Terra em estudo ainda inédito sobre a atividade econômica na Amazônia mostram um peso ainda maior da produção local de soja (39%) e algodão (47%). A Amazônia Legal produziu, em 2005, 20,1 milhões de toneladas de soja, ou quase 10% da produção mundial. Segundo a CNA, mais de 98% dos 66 mil quilômetros quadrados de plantações de soja dessa safra da Amazônia Legal foi plantada e colhida em áreas de cerrado.

A participação na produção nacional de soja, carne e algodão da Amazônia já supera o percentual da produção local de madeira.

Álcool
Ainda de acordo com dados compilados pela ONG Amigos da Terra, com base em informações da Única (União da Indústria de Cana-de-Açúcar), a Amazônia Legal produziu, em 2006, aproximadamente 1 milhão de litros de álcool, ou 6% dos 16 milhões de litros produzidos no país. Os números, mais uma vez, contrariam o discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que a produção de álcool se mantém distante da floresta.

Quando o governo divulgar regras do zoneamento ecológico-econômico, com indicações de onde ficará liberado o cultivo de cana-de-açúcar, encontrará uma atividade em expansão, segundo relatório da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), vinculada ao Ministério da Agricultura. É previsto para o mês que vem o anúncio do zoneamento.

 

Fonte: Folha de São Paulo - edição de 15 de junho de 2008.

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