Black Friday

Black Friday

8 de dezembro de 2017
por Amanda Cordeiro Ribeiro -
Colégio Recanto - Rio de Janeiro, RJ


Em um telejornal vemos imagens de multidões se esbarrando nos apertados corredores de uma grande loja de eletrodomésticos no Black Friday.

Black Friday é mais uma dessas datas importadas e pautadas de um momento para o outro na agenda midiática anual. Termo criado pelo varejo nos EUA para o dia das grandes ações de vendas com descontos e promoções após o feriado de Ação de Graças, vem desde 2010 sendo adotado pelas grandes lojas tanto on line como físicas no Brasil.

Uma senhora aposentada é sincera com uma repórter, vira para a câmera e dispara: “vim aqui para comprar outra coisa, mas acabei vendo uma TV de 50 polegadas em promoção e acabei comprando!”. Nem dezenas de sessões de psicanálise fariam alguém aflorar tal sinceridade: o ato impulsivo e irracional foi racionalizado por uma palavra mágica: “promoção”.

A aparência racional da lógica do custo/benefício contida na palavra /promoção/ serve como um placebo psíquico que nos liberta da má consciência da culpa.

Nos tempos da sua fase semiológica, em 1973 o pensador francês Jean Baudrillard, em seu livro O Sistema dos Objetos, criou um dos conceitos talvez menos compreendidos da sua obra: a “Lógica do Papai Noel”. Ele via na Publicidade uma lógica da fábula e da adesão, semelhante ao que as crianças fazem com seus mitos, sem se interrogar sobre a existência deles.

Assim como o Papai Noel, onde crianças e adultos não creem nele e nem na sua relação de causa e efeito com os presentes.

“A crença no Papai Noel é uma fábula racionalizante que permite preservar na segunda infância a miraculosa relação de gratificação pelos pais (mais precisamente pela mãe) que caracteriza a relação da primeira infância. (…) se fundamenta no interesse recíproco que as duas partes têm em preservar a relação. O Papai Noel em tudo isso não tem importância e a criança só acredita nele porque no fundo não tem importância.” (BAUDRILLARD, Jean. O Sistema dos Objetos, São Paulo: Perspectiva, 1973, p. 176).

Para Baudrillard a operação publicitária seria da mesma ordem: nem slogans, textos publicitários ou informações são decisivos para a compra. As pessoas não acreditam em Publicidade mais do que acreditam em Papai Noel. Então para que serve a Publicidade? Para racionalizar o desejo da compra.

Aqui Baudrillard aproxima-se da noção freudiana da racionalização como um álibi perfeito. O ser humano não é um ser propriamente racional, mas racionalizante: a maior parte do tempo agindo por impulso ou compulsão, sem ser “racional” no sentido de pensar antes de agir. Por isso o indivíduo necessita de um álibi para justificar diante dos outros e de si mesmo a razão dos seus atos.

Tal como o criminoso que sabe que cometeu o crime, ele necessita de um álibi. Assim como o criminoso que não acredita no álibi porque sabe que cometeu o crime, da mesma forma o consumidor acha bastante útil o álibi: para fazê-lo esquecer do crime.

Slogans e toda a retórica publicitária nada mais seria do que o Papai Noel oferecido para o consumidor criar uma “desculpa” para si mesmo e aos outros sobre o porquê da aquisição. Um motivo nobre, aqui, uma promoção ali ou uma “relação custo benefício” acolá. Ou um evento midiático como o Black Friday, o Papai Noel dos adultos.


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