Brasil entra na corrida por terras raras, o ouro do século 21
Se você ainda não sabe o que são terras-raras, prepare-se, porque nos próximos anos esse conjunto de 17 minerais fará cada vez mais parte da sua vida. Elementos de nomes estranhos como disprósio, lantânio e promécio tornaram-se essenciais para a indústria de alta tecnologia. Eles são responsáveis pela finura dos tablets, fazem o seu celular vibrar e acendem as futuristas lâmpadas de LED. Por trás de tanta modernidade, a briga pela supremacia na exploração das terras-raras deu início a um intrincado jogo de interesses econômicos, diplomáticos e industriais, tendo a China, maior produtora mundial, como fiel da balança.
Mas o Brasil, depois de um século, pode estar de volta ao jogo. No ano passado, o serviço geológico do governo dos Estados Unidos (USGS, na sigla em inglês) apontou o País como a nova fronteira global de minerais raros. Segundo a agência americana, o potencial nacional chega a 52 milhões de toneladas em reservas. Para ter uma ideia do que isso significa, levantamento de depósitos de 2011 do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM)- órgão federal de controle da atividade mineral no País - registrou a incidência de apenas 40 mil toneladas em solo brasileiro, menos de 1% do volume indicado pelo USGS.
Não à toa, os ministérios de Minas e Energia e Ciência e Tecnologia desenvolvem um programa nacional de minerais estratégicos para identificar esses depósitos e, assim, diminuir a dependência do País. O Brasil importa hoje cerca de 70% das terras-raras de que necessita. A luz amarela do governo acendeu quando a Fábrica Carioca de Catalisadores enfrentou problemas com o fornecimento de matéria-prima local. A empresa é a principal cliente da monazita produzida pelas Indústrias Nucleares do Brasil (INB), única fornecedora das terras-raras utilizadas no refino de petróleo da Petrobrás, que detém 50% da Carioca.
Com o pré-sal, o consumo do mineral aumentará junto com a produção de óleo nos depósitos submarinos da costa brasileira. Daí vem a preocupação do Palácio do Planalto. "O Brasil é rico em rochas carbonáticas, só perde em recursos para a China. Não há dúvidas de que o País é a nova fronteira de terras-raras", Brasil entra na corrida por terras-raras, afirma o geólogo David Siqueira Fonseca, do DNPM.
Disputa diplomática. A China é o principal produtor mundial de terras-raras, com cerca de 130 mil toneladas por ano - nada menos que 97,5% da produção e 95% do mercado exportador global. A Índia, que produziu 3 mil toneladas em 2011, aparece num distante segundo lugar. Pequim, contudo, limitou suas exportações a 30 mil toneladas por ano em 2009, em uma decisão vista inicialmente como retaliação diplomática ao Japão, após uma escaramuça em águas territoriais entre os dois países. A briga asiática ganhou contornos globais neste ano, após Estados Unidos e União Europeia apoiarem a iniciativa japonesa de apresentar acusação de reserva de mercado contra a China na Organização Mundial do Comércio (OMC). O assunto foi tema de discurso do presidente Barack Obama, que acusou a China de travar o comércio mundial de terras-raras para concentrar as indústrias de alta tecnologia em seu território.
A limitação na venda dos minerais extraídos na China provocou a disparada dos preços das terras-raras. O aumento no número de pedidos de pesquisa geológica no Brasil reflete essa reviravolta no mercado e coloca o País em novo patamar na corrida tecnológica do século 21. "Sem terras-raras, não existe carro elétrico, celular, tablet", pontua Siqueira, do DNPM.
No Brasil, a exploração do insumo é feita em escala pequena apenas pelas Indústrias Nucleares do Brasil (INB), a partir do processamento de areias monazíticas em São Francisco de Itaborana, no Rio de janeiro. A produção atingiu 290 toneladas em 2011, conforme dados do DNPM. O volume foi quase um terço das 834 toneladas produzidas em 2008, o que alertou o governo para diminuir a dependência da importação, especialmente de olho na demanda de catalisadores pela Petrobrás. A Vale também corre para verificar se há viabilidade econômica em separar as terras-raras do fosfato produzido pela companhia para a produção de fertilizantes.
Outra gigante que começa a entrar no segmento é a Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM), maior produtora mundial de nióbio, que, segundo o DNPM, teria estocado restos de minérios com alto teor de terras-raras ao longo dos anos e agora estaria disposta a explorá-los comercialmente. A empresa não comenta o assunto.
Oportunidade industrial. O desafio será a indústria brasileira acompanhar com produção o potencial de reserva indicado pelos geólogos americanos. A disposição da chinesa Foxconn, produtora dos tablets da Apple, de instalar fábrica nointerior de São Paulo pode ser um passo importante. Mas, como observa Pedro Galdi, da SLW Corretora, a investida vale se o Brasil não figurar no cenário como fornecedor de matéria- prima para a produção na China das placas utilizadas nos tablets. "O que a China quer é desenvolver a produção de terras-raras em vários lugares do mundo", alerta o analista da SLW, sobre o risco de o Brasil ser apenas exportador da commodity cotada para ser o ouro do século 21.
A matéria original pode ser lida, na íntegra, em: http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=84231
Fonte: Adaptado de Nivaldo Venâncio - no caderno especial O Brasil Inovador do jornal O Estado de São Paulo - 20/09/2012